Muitos praticantes da Wicca e da Bruxaria Moderna conhecem a figura da Deusa Tríplice. Talvez essa seja a imagem mítica mais básica da Tealogia moderna. Entretanto, acredita-se também que elas são elaborações imagéticas totalmente contemporâneas. Mas se não for bem assim?? Pois bem, essa triplicidade de deusa-mãe é bem mais antiga do que se imagina. A interpretação, porém, em "Jovem, Mãe e Anciã" pode ser mais moderna, devido a influência da literatura de Robert Graves. Todavia, a imagem das Mães, Matres ou Matronaes tríplas datam desde o século I E.C. (ou antes), como veremos ao londo deste artigo.
Segundo Miles Clifford, a Grã-Bretanha antiga abrigava um número incalculável de deuses e espíritos, que variavam desde cultos locais britânicos relacionados à água até religiões de mistério orientais com origens sírias.
O culto mais popular em Corinium (ou Corínia) e arredores, na época romana, parece ser o das Matres ou Mães (Corinium foi o assentamento romano-britânico em Cirencester, no atual condado inglês de Gloucestershire). Descobertas arqueológicas em sítios dentro e ao redor de Cirencester (tais como Ashcroft, Watermoor Road e Daglingworth) atestam a existência de um culto local popular, com numerosos relevos, altares e imagens representando as Mães, que geralmente se apresentam em forma tripla (placas esculpidas com figuras de 3 mulheres/deusas).
Os relevos acima, datados do século II ou III d.C., retrata três deusas sentadas, esculpidas em calcário oolítico local. Foram recuperados de um sítio arqueológico em Ashcroft, em 1899. O volume de material recuperado no local parece indicar a presença de um grande santuário ou templo dedicado, pelo menos em parte, às essas Matres. Este potencial templo destaca a importância das deusas-mãe para os habitantes da Corínia romana (Grã-Bretania romana), com um edifício religioso situado no centro cívico da região.
A arqueóloga celtista Miranda Aldhouse-Green afirma que o número 3 é muito importante e simbólico nas mitologias celtas e muitas imagens femininas trinas são encontradas nas regiões onde viviam os povos que hoje os estudiosos chamam de celtas. Nos revelos acima, estão, à esquerda, três deusas-mães portando pães, frutas e cereais, possivelmente representando a colheita e a fartura e, à direita, três deusas-mães, estando a do centro carregando um bebê.
Embora o culto às Matres pareça ter sido particularmente popular e significativo em Corínio (Grã-Bretânia), não se tratava de um fenômeno exclusivamente local. Dedicações e altares às deusas-mãe podem ser encontrados em todas as províncias do norte da Europa do Império romano. Dados arqueológicos indicam que a evidência mais antiga do culto às Matres data do século I d.C., em um sítio na Gália, atual França. Essa evidência parece sugerir que o culto às Matres pode ter sido trazido para a Grã-Bretanha durante a conquista romana de 43 d.C. e popularizado nos séculos seguintes. Entretanto, essa imagem tripla da deusa-mãe foi assimilada pelas populções celtas locais, pois estes já tinham relação de culto com divindades femininas e, por tanto, fizeram associação da imagem da deusa-tripla com uma deusa que já possuíam na sua própria região.
Esse fato pode ser atestado na placa de altar mostrada acima, com a inscrição "Suleviae", também encontrada em Cirencester, junto à imagem das Matres. As deusas-mães podem, então, ter sido amplamente conhecidas por esse nome nessa região. Isso é revelado pelo estudo de evidências epigráficas (baseadas em inscrições), como a placa acima, recuperada no sítio arqueológico de Ashcroft em 1899. Essa inscrição, assim como outras em Bath e arredores, refere-se às Mães como Suleviae, um nome local que indica uma clara conexão com Sulis, uma deusa celta cultuada principalmente em Bath. É provável que as Matres fossem conhecidas por outros nomes locais, em qualquer província romana onde tivessem presença, como na Germânia (Alemanha), onde são comumente chamadas de Matronae ou Matronas.
Este ícone, na imagem acima à esquerda, parece representar a deusa-mãe sentada ao lado dos 'Genii Cucullati' ou espíritos encapuzados, e foi recuperado arqueologicamente em Cirencester em 1964 (Na imagem à direita, uma placa das deusas-mães encapuzadas encontrada no forte romano Housestead - na Muralha de Adriano (Northumberland, Inglaterra)). A função desses espíritos é desconhecida, embora possam ter representado a fertilidade ao lado da deusa-mãe ou oferecido proteção às divinas Matres. Curiosamente, eles aparecem com muita frequência junto às imagens e altares dedicados às Matres em toda a região de Cotswolds, especialmente no possível sítio arqueológico do templo em Cirencester.
Muitos detalhes sobre o Culto das Matres são desconhecidos ou baseiam-se em grande parte em um conjunto fragmentário de evidências arqueológicas. Uma certeza singular em relação ao culto da deusa-mãe é a relação entre a Corínia romana (Grã-Bretania romana) e as deusas-mãe, que talvez representassem uma divindade padroeira para a capital de uma importante província romana.
Segundo Ralph Häussler, elas são geralmente chamadas de "Mães", Matres ou, na Gália Cisalpina e na Renânia (Alemanha), de Matronae. Embora o termo atestado em inscrições latinas seja de origem latina, as placas são encontadas em regiões "celtas" e germânicas (Bretânia-romana, França e Alemanha) e não há equivalentes a "mães" ou "matronas" na religião romana (as Parcas romanas são diferentes). O nome Matres, ou no dativo matribus - "às mães", soa bastante semelhante ao equivalente celta, como as dedicatórias matrebo de Nîmes e Glanum (ambos na França).
Mesmo que essa tríade de deusas-mãe seja difundida nas províncias romanas ocidentais, bem como na Gália Cisalpina, existem obviamente inúmeras variações como na iconografia e, talvez, também na função. Abaixo um exemplo de deusas-mãe (Dea) encontrada em Nethersheim, Alemanha:
Além disso, também obtemos outros nomes:
Suleviae: 'a que guia', é um teônimo celta bem documentado no sul da Gália na época romana. Este pode ser um sobrenome que representa uma das funções das deusas-mãe.
Proxumae: "deusas da proximidades", que parecem ser semelhantes às deusas-mãe (encontadas em Nîmes).
Iunones: no sul da Gália, as Iunones parecem ser equivalentes às deusas-mãe. Na pedra abaixo à direita, refere-se a uma tríade para Juno, semelhante as Matres.
Parcae: entalhe das "Parcas" encontrada em Nîmes (pedra abaixo à esquerda), que parecer ser uma interpretatio romana das deusas-mães triplas.
Uma interessante representação das deusas-mães/matres foi descoberta em Vasio (Vaison-la-Romaine, França) (imagem abaixo). Vemos a imagem típica das três mães, sentadas, carregando uma cesta de frutas no colo. Mas desta vez, elas estão sentadas em um pódio, em uma estrutura semelhante a um templo, do tamanho de um larário (altar doméstico). A parte de trás também é decorada com motivos vegetais.
A imagem da Deusa Tríplice é, então, a sobrevivência de uma memória muito profunda dessas Matronas tríplas de séculos atrás. Hoje a chamamos Jovem, Mãe e Anciã, numa reinterpretação mítica e imagética atual, derivada de novos movimentos artísticos e referente às necessidades da contemporaneidade. Agora, elas são equiparadas as estações e a Roda do Ano agrária. Inclusive, esse movimento de reinterpretação é característico da Tealogia moderna. Mantendo-se, assim, viva a memória e a força da deusa secular "Matre tripla". Senhora da fartura, da vida e da bonança ))0((.
Texto de Lídia Valle~~
Mestra e Doutoranda em Ciências das Religiões, pela UEPA e UFPB - PPGCR, respectivamente.
Referências Bibliográficas:
Site do Museu Corinium: https://coriniummuseum.org/2019/08/mother-goddesses/
Miles Clifford é um estudante de graduação em Arqueologia na Universidade de Southampton e tem visitado a coleção do Museu Corinium como pesquisador para sua dissertação, que avalia o poder político e a influência dos cultos locais.
Site de Ralph Häussler: https://ralphhaussler.weebly.com/mother-goddesses.html
ALDHOUSE-GREEN, Miranda. Os mitos celtas - um guia para deuses e lendas antigas. Tradução Caesar Souza. Petrópolis, RJ: Vozes, 2022.
sexta-feira, 21 de novembro de 2025
sexta-feira, 19 de setembro de 2025
Autoras da Tealogia - parte 1: Patrícia 'Iolana
Eu já vinha pensando em fazer uma série, aqui no blog, de textos específicos sobre as principais autoras da Tealogia e, hoje, decidi começar. A primeira dessa série será Patrícia 'Iolana, uma acadêmica da área da Religion Studies (aqui no Brasil, Ciências da Religião) muito importante para o desenvolviento da área da Tealogia a nível mundial.
Sua jornada acadêmica:
Em 1993, fez escola técnica (AA) em Artes Liberais (com honras) no Colégio Comunitário do Hawaii.
Em 1995, entrou no Bacharelado (BA) em Inglês e Artes Cênicas pela Universidade do Norte do Colorado.
Em 2008, entrou no Mestrado (MA) em Humanidades na Universidade Estadual da California.
Em 2016, começou seu Doutorado (PhD) em Literatura, Teologia e Artes na Universidade de Glasgow na Escócia.
A carreira de pesquisa de Patrícia é realmente impressionante, além de suas produções paralelas, artigos e livros sobre o Divino Feminino. Sua Monografia (dissertação de Mestrado) foi sobre o Sagrado Feminino na Literatura, intitulada Literature of the Sacred Feminine: Great Mother Archetypes and the Re-emergence of the Goddess in Western Traditions. Sua dissertação virou sua única obra à venda nas grandes plataformas de livros: Na pesquisa de Doutorado, ela adentrou na TEALOGIA em si, mais epecificamente como a teoria Junguiana e Pós-junguiana contribuiram para o desenvolvimento do "movimento da Deusa no Ocidente". Ela hoje se classifica como uma "Teáloga Profunda", a qual combina psicologia analítica pós-junguiana com a Tealogia (ou discurso sobre a Deusa), pois o foco de Patrícia são as experiências pessoais e ela as aborda a partir de uma perspectiva psicodinâmica chamada "Tealogia das Profundezas".
De 2009 a 2015, ela foi membro bastante ativa da Beltane Fire Society, sediada em Edimburgo, na Escócia. Patrícia 'Iolana também é uma Reverenda, Ministra pagã ordenada, e defensora do movimento inter-religioso.
Patrícia organizou revistas sobre Tealogia:
(2011) Testing the Boundaries: Self, Faith, Interpretation and Changing Trends in Religious Studies (Testando os limites: eu, fé, interpretação e tendências de mudança nos estudos religiosos).
(2011) Goddess Thealogy: An International Journal for the Study of the Divine Feminine (Tealogia da Deusa: Um periódico internacional para o estudo do Divino Feminino). Trabalhos como Autora contribuinte (Revisora em pares):
(2018) Jung’s Legacy: The Western Goddess Movement, publicado na revista Spaces of Spirituality. Tradução: O Legado de Jung: O Movimento Ocidental da Deusa.
(2017) Coming Home to Goddess, publicado no livro eletrônico Celebrating Seasons of the Goddess (No Mago Books). Tradução: Voltando para casa com a Deusa.
(2016) 21st Century Ministry: The Importance of Interfaith and Intrafaith Dialogue in Modern Goddess-centred Faith Traditions, no livro de Karen Tate Goddess 2.0: A New Path Forward. Tradução: Ministério do Século XXI: A Importância do Diálogo Inter-religioso e Intra-religioso nas Tradições de Fé Modernas Centradas na Deusa.
(2016) Goddess: The ‘Angel of Light’, no livro eletrônico She Rises: How Goddess Feminism, Activism and Spirituality (Mago Books). Tradução: Deusa: O ‘Anjo da Luz’.
(2012) Divine Immanence: A Psychodynamic Study in Women’s Experience of Goddess, publicado na revista Claremont Journal of Religion. Tradução: Imanência Divina: Um Estudo Psicodinâmico da Experiência Feminina com a Deusa.
(2012) The Sublime and the Profane: A Thealogical Account of Psychometric Experiences within a Sacred Space, na revista Paranthropology: Journal of Anthropological Approaches to the Paranormal. Tradução: O Sublime e o Profano: Um Relato Tealógico de Experiências Psicométricas em um Espaço Sagrado.
Tem os artigos que Patrícia 'Iolana escreveu com Angela Hope, para a revista que a própria Patrícia organizou, Goddess Thealogy: An International Journal for the Study of the Divine Feminine, já citada anteriormente, tais como (2011) Footsteps on the Path to Experiencing the Feminine Divine: A Phenomenological Account of a Collective Thealogical Journey in Academia (Passos no Caminho para a Experiência do Divino Feminino: Um Relato Fenomenológico de uma Jornada Tealógica Coletiva na Academia); e Thealogy: Mapping a Fluid and Expanding Field (Tealogia: Mapeando um Campo Fluido e em Expansão).
Tem seus artigos publicados na outra revista organizada por Patrícia, também já mencionada, Testing the Boundaries: Self, Faith, Interpretation and Changing Trends in Religious Studies, a saber: (2011) Introduction (Introdução); Self Image: Re-imaging the Self and the Divine (Autoimagem: Reimaginando o Eu e o Divino); Radical Images of the Feminine Divine: Women’s Spiritual Memoirs Disclose a Thealogical Shiſt (Imagens radicais do divino feminino: memórias espirituais femininas revelam uma mudança tealógica); e Changing Trends: Moving Beyond Traditional Boundaries (Tendências em mudança: indo além das fronteiras tradicionais).
(2006) Tutu Pele: The Living Goddess of Hawai’i’s Volcanoes, publicado na revista Sacred History Magazine. Tradução: Tutu Pele: A Deusa Viva dos Vulcões do Havaí.
Infelizmente, os trabalhos de Patrícia estão todos em inglês, nenhum livro dela, revista ou livro o qual ela tenha participado foi traduzido para o português (ainda, pois estou me organizando para fazer resenhas das obras dela para publicar hehehe). Mas para os que conseguem ler o idioma, eu super recomendo, pois o trabalho dela é incrível, na verdade, um espetáculo, principalmente para buscadores da Tealogia. E para os que não conseguem ler em inglês, existem bons sites que traduzem artigos completos.
A maioria dos artigos e revistas de 'Iolana são gratuitos e estão disponíveis em PDFs nas páginas da internet, especialmente no academia.edu, no link: https://glasgow.academia.edu/PatriciaIolana
Seu livro sobre Sagrado Feminino e Literatura está disponível em sites de venda e os Ebooks do MagoBooks (Celebrating Seasons of the Goddess e She Rises) também são pagos, no link: https://www.magobooks.com/she-rises-vol-2/
Espero que meu breve resumo do trabalho desta brilhante teáloga possa ter ajudado aos buscadores e estudiosos da Tealogia. Até breve! Texto de Lídia Valle ~
#Tealogia #Thealogy #Deusa #Goddess #divinofeminino #femininedivine #deusas #goddesses #cienciasdareligiao #religionstudies #PatriciaIolana #Jung
Sua jornada acadêmica:
Em 1993, fez escola técnica (AA) em Artes Liberais (com honras) no Colégio Comunitário do Hawaii.
Em 1995, entrou no Bacharelado (BA) em Inglês e Artes Cênicas pela Universidade do Norte do Colorado.
Em 2008, entrou no Mestrado (MA) em Humanidades na Universidade Estadual da California.
Em 2016, começou seu Doutorado (PhD) em Literatura, Teologia e Artes na Universidade de Glasgow na Escócia.
A carreira de pesquisa de Patrícia é realmente impressionante, além de suas produções paralelas, artigos e livros sobre o Divino Feminino. Sua Monografia (dissertação de Mestrado) foi sobre o Sagrado Feminino na Literatura, intitulada Literature of the Sacred Feminine: Great Mother Archetypes and the Re-emergence of the Goddess in Western Traditions. Sua dissertação virou sua única obra à venda nas grandes plataformas de livros: Na pesquisa de Doutorado, ela adentrou na TEALOGIA em si, mais epecificamente como a teoria Junguiana e Pós-junguiana contribuiram para o desenvolvimento do "movimento da Deusa no Ocidente". Ela hoje se classifica como uma "Teáloga Profunda", a qual combina psicologia analítica pós-junguiana com a Tealogia (ou discurso sobre a Deusa), pois o foco de Patrícia são as experiências pessoais e ela as aborda a partir de uma perspectiva psicodinâmica chamada "Tealogia das Profundezas".
De 2009 a 2015, ela foi membro bastante ativa da Beltane Fire Society, sediada em Edimburgo, na Escócia. Patrícia 'Iolana também é uma Reverenda, Ministra pagã ordenada, e defensora do movimento inter-religioso.
Patrícia organizou revistas sobre Tealogia:
(2011) Testing the Boundaries: Self, Faith, Interpretation and Changing Trends in Religious Studies (Testando os limites: eu, fé, interpretação e tendências de mudança nos estudos religiosos).
(2011) Goddess Thealogy: An International Journal for the Study of the Divine Feminine (Tealogia da Deusa: Um periódico internacional para o estudo do Divino Feminino). Trabalhos como Autora contribuinte (Revisora em pares):
(2018) Jung’s Legacy: The Western Goddess Movement, publicado na revista Spaces of Spirituality. Tradução: O Legado de Jung: O Movimento Ocidental da Deusa.
(2017) Coming Home to Goddess, publicado no livro eletrônico Celebrating Seasons of the Goddess (No Mago Books). Tradução: Voltando para casa com a Deusa.
(2016) 21st Century Ministry: The Importance of Interfaith and Intrafaith Dialogue in Modern Goddess-centred Faith Traditions, no livro de Karen Tate Goddess 2.0: A New Path Forward. Tradução: Ministério do Século XXI: A Importância do Diálogo Inter-religioso e Intra-religioso nas Tradições de Fé Modernas Centradas na Deusa.
(2016) Goddess: The ‘Angel of Light’, no livro eletrônico She Rises: How Goddess Feminism, Activism and Spirituality (Mago Books). Tradução: Deusa: O ‘Anjo da Luz’.
(2012) Divine Immanence: A Psychodynamic Study in Women’s Experience of Goddess, publicado na revista Claremont Journal of Religion. Tradução: Imanência Divina: Um Estudo Psicodinâmico da Experiência Feminina com a Deusa.
(2012) The Sublime and the Profane: A Thealogical Account of Psychometric Experiences within a Sacred Space, na revista Paranthropology: Journal of Anthropological Approaches to the Paranormal. Tradução: O Sublime e o Profano: Um Relato Tealógico de Experiências Psicométricas em um Espaço Sagrado.
Tem os artigos que Patrícia 'Iolana escreveu com Angela Hope, para a revista que a própria Patrícia organizou, Goddess Thealogy: An International Journal for the Study of the Divine Feminine, já citada anteriormente, tais como (2011) Footsteps on the Path to Experiencing the Feminine Divine: A Phenomenological Account of a Collective Thealogical Journey in Academia (Passos no Caminho para a Experiência do Divino Feminino: Um Relato Fenomenológico de uma Jornada Tealógica Coletiva na Academia); e Thealogy: Mapping a Fluid and Expanding Field (Tealogia: Mapeando um Campo Fluido e em Expansão).
Tem seus artigos publicados na outra revista organizada por Patrícia, também já mencionada, Testing the Boundaries: Self, Faith, Interpretation and Changing Trends in Religious Studies, a saber: (2011) Introduction (Introdução); Self Image: Re-imaging the Self and the Divine (Autoimagem: Reimaginando o Eu e o Divino); Radical Images of the Feminine Divine: Women’s Spiritual Memoirs Disclose a Thealogical Shiſt (Imagens radicais do divino feminino: memórias espirituais femininas revelam uma mudança tealógica); e Changing Trends: Moving Beyond Traditional Boundaries (Tendências em mudança: indo além das fronteiras tradicionais).
(2006) Tutu Pele: The Living Goddess of Hawai’i’s Volcanoes, publicado na revista Sacred History Magazine. Tradução: Tutu Pele: A Deusa Viva dos Vulcões do Havaí.
Infelizmente, os trabalhos de Patrícia estão todos em inglês, nenhum livro dela, revista ou livro o qual ela tenha participado foi traduzido para o português (ainda, pois estou me organizando para fazer resenhas das obras dela para publicar hehehe). Mas para os que conseguem ler o idioma, eu super recomendo, pois o trabalho dela é incrível, na verdade, um espetáculo, principalmente para buscadores da Tealogia. E para os que não conseguem ler em inglês, existem bons sites que traduzem artigos completos.
A maioria dos artigos e revistas de 'Iolana são gratuitos e estão disponíveis em PDFs nas páginas da internet, especialmente no academia.edu, no link: https://glasgow.academia.edu/PatriciaIolana
Seu livro sobre Sagrado Feminino e Literatura está disponível em sites de venda e os Ebooks do MagoBooks (Celebrating Seasons of the Goddess e She Rises) também são pagos, no link: https://www.magobooks.com/she-rises-vol-2/
Espero que meu breve resumo do trabalho desta brilhante teáloga possa ter ajudado aos buscadores e estudiosos da Tealogia. Até breve! Texto de Lídia Valle ~
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quarta-feira, 18 de junho de 2025
Tealogia - breve histórico do termo, seu significado e princípios básicos!
O termo Tealogia trata-se de um neologismo, que vem do grego Thea = Deusa e Logia = estudo, razão, princípios. Sendo assim, Tealogia pode ser traduzida como estudo da Deusa, mas também pode ser entendida como ação divina da Deusa no mundo e princípios éticos seguidos por seus devotos.
Trata-se de um conceito cunhado na década de 70, mais especificamente em 1974, em textos do cantor e escritor neo-druida Isaac Bonewits, intitulados The Druid Chronicles – Evolved, onde ele provavelmente usou o termo "thealogian" para se referir ao autor wiccano Aidan Kelly, o qual pode ter sugerido o termo para ele ou vice versa. Apesar de diversos sites alegarem tal informação, não é nada fácil encontrar esses textos de Isaac, tendo em vista que eram revistas impressas da década de 40, que provavelmente nunca foram digitalizadas, existem apenas relatos na internet de sua existência. Entretanto, na primeira edição revisada de seu livro Real Magic (1971, 1979, 1989), de 1979, é possivel encontrar o termo facilmente, pois Isaac Bonewits definiu Tealogia em seu Glossário como "Especulação intelectual sobre a natureza da Deusa e Suas relações com o mundo em geral e os humanos em particular; explicações racionais de doutrinas religiosas, práticas e crenças [femininas], que podem ou não ter conexão com qualquer religião específica, nem como tal seja concebida e praticada pela maioria de seus membros” (BONEWITS, 1989, p. 268).
O que se observa é que Isaac se limitou a colocar o termo com uma explicação bem resumida apenas no Gloissário de seu livro, nas ultimas páinas apenas, ou seja, ele foi o precursor da terminologia, como observador de algo que estava acontecendo ao seu redor, mas parou por aí mesmo. As questões centrais da Tealogia, todavia, foram amplamente desenvolvidas por autoras posteriores, tais como Naomi Goldenberg, Rita Nakashima Brock, Charlotte Caron, Melissa Raphael e Carol P. Christ, entre outras autoras que citaram a respeito do desenvolvimento da Tealogia. O que TODAS elas tinham em comum era sua formação, a saber: a TeOlogia. Elas eram teólogas de formação, começaram a flertar com a teologia feminista, até culminarem no movimento que elas mesmas estavam criando: a TEALOGIA.
O interessante é que Naomi Goldenberg também é formada em Religious Studies (que aqui no Brasil, chamamos Ciências da(s) Religião(ões)). Sua formação acadêmica permitiu que ela fizesse uma leitura crítica e conceitual do movimento da Deusa que estava ocorrendo nos EUA, e em outros países, na época, sistematizando-as em seu livro de 1979 Changing of the Gods - feminism & the end of traditional religions. Nesta obra, ela dedica um breve tópico para explicar a Tealogia através da natureza tríplice da Deusa. Nada muito novo do que já se ouve falar sobre a Deusa desde o início de seu movimento tanto na literatura quanto na Bruxaria Moderna, porém, o terreno da Tealogia já estava "arado" a partir de então, para suas sementes serem plantadas. Sua página: https://naomigoldenberg.com/
A teóloga protestante norte-americana Rita Nakashima Brock, em seu artigo de 1989, On Mirrors, Mists and Murmurs: Toward an Asian American Thealogy, usou o termo Tealogia de forma inovadora, ao afirmar que desenvolveu uma “Tealogia do sofrimento, comunidade e cura”, a partir de várias fontes religiosas e espirituais (Budismo, Cristianismo, Paganismo, etc.), as quais são costuradas e interpretadas pelas vivências e experiências de vida das mulheres, trocadas nesses encontros.
Em 1993, a teóloga canadense Charlotte Caron da Tealogia publicou a obra To Make and Make Again: Feminist Ritual Thealogy. Em sua obra, ela desenvolve uma grande discussão sobre o tema, enuncia os métodos e características da Tealogia, além de sugerir diversas formas rituais, motivadoras de novas atitudes sociais, para as mulheres vivenciarem essa espiritualidade.
Em 1996, a teóloga judia inglesa Melissa Raphael publicou Thealogy and Embodiment: the post-patriarchal reconstruction of female sacrality. Melissa discute sobre a relação da Tealogia com a corporeidade humana, em especial os trabalhos/atributos considerados "femininos" (e tece suas críticas), o tabu da menstruação e as cosmogonias advindas do útero.
A autora também escreveu Introducing Thealogy: Discourse On The Goddess em 1999. Neste livro, Melissa traz a história política da Tealogia, sua relação com o movimento feminista e a Teologia feminista, bem como o distanciamento posterior da Tealogia desses movimentos. Discute também a ética na Tealogia, o Ecofeminismo, o bem e o mal na Tealogia e o lugar do homem na Tealogia.
Carol P. Christ também era teóloga judia e já havia usado o termo em sua obra Laughter of Aphrodite: reflections on a journey to the goddess em 1987. Carol P. Christ lançou vários outros livros sobre o tema, ao longo de sua vida, e tornou-se uma das principais autoras da Tealogia, entre eles estão: Rebirth of the goddess (1997), She Who Changes (2003), A Serpentine Path: Mysteries of the Goddess (2016) e Goddess and God in the World: Conversations in Embodied Theology (2016).
No livro Rebirth of the goddess (1997), traduzido recentemente para o português como o Renascimento da Deusa, em 2024, pela editora Goya (Aleph), Carol discute a Tealogia de forma profunda. Ela traz também os significados da Deusa, as evidências do passado, a resistência acadêmica em avançar nos seus estudos, bem como traz discussões éticas da Tealogia, a Teia da vida, a Mãe-Terra como organismo vivo e consciente (hipótese Gaia), cooperação e preservação ambiental, o lugar da humanidade nessa teia, vida após a morte, e a importância da preservação das imagens politeístas da Deusa para fomentar o respeito a diversidade dos grupos humanos.
Percebe-se que o termo Tealogia começou a ser “forjado” a partir das vivências das mulheres em grupos comunitários de apoio mútuo e, também, de reflexões dentro da própria academia. As autoras, na sua totalidade acadêmicas, começaram a buscar nas fontes arqueológicas, antropológicas, mitológicas e simbólicas algo que melhor representasse aquilo que as mulheres viviam e narravam em suas reuniões femininas guiadas pelo conceito divino de Deusa. A crença na Deusa já existia em outros grupos neopagãos, na Bruxaria Moderna, etc., entretanto foi expandida e delineada na Tealogia. Nota-se, então, que a Tealogia trata-se de um movimento filosófico, nascido da experiência, mas também de mulheres ligadas a instituições de ensino de Teologia e Ciências da Religião. Dessa forma, tem as características de buscar responder/refletir acerca dos mistérios da vida, a ética, nossa relação com o mundo e as formas de nutrir um novo estilo vida.
Baseado no primeiro livro de Tealogia traduzido para o português, o Renascimento da Deusa, de Carol P. Christ (o original foi publicado em 1997), sintetizei os principais princípios da Religião da Deusa desenvolvidos por Carol. Uma das características básicas de sua obra é se basear no Imaginário da Deusa pré-histórica, defendida por alguns arqueólogos e estudiosos, como James Mellaart, Marija Gimbutas, Riane Eisler, etc., a qual foi batizada por Gimbutas como Deusa da Vida, Morte e Renascimento. As sociedades pré-históricas, em especial as neolíticas, tinham uma formatação menos bélica, mais agricultora, comunitárias e centradas nos ciclos soli-lunares. Desse modo, a Tealogia de Carol Christ está mais ligada a esse momento do feminino divino do que necessariamente nas deusas do politeísmo tardio, onde os deuses celestres patriarcais já estavam no topo da hierarquia. Segue, então, os princípios básicos da Tealogia em Renascimento da Deusa:
Culto à Mãe - Terra e à outras faces da Deusa: Carol P. Christ (1997) afirma que no pensamento da Tealogia, devido ao foco no divino feminino, no culto à Mãe-Terra e na materialidade, trata-se de uma espiritualidade prática, voltada também a vida imanente e material, à nutrição da vida na Terra, preservação ecológica e, também, à ampliação da visão dos papéis femininos na sociedade, haja vista a diversidade de deusas e arquétipos femininos possíveis mesmo na lógica unificadora de Deusa.
Culto à Teia da Vida e a interdependência de todos: Dessa forma, volta-se a entender toda a TEIA da VIDA como sagrada (a própria Deusa). Todas as plantas, animais e elementos da natureza passam a fazer parte do corpo espiritual tealógico, e todos esses seres estão conectados em interdependência na teia. A experiência mística ocorrerá, então, na vivência da comunidade, na preservação do planeta e em relações saudáveis.
É um sistema Panenteísta e Politeísta: Carol (1997) define que “a mente da Deusa é uma energia animadora que permeia o corpo do mundo e que permite que tudo [...] converse entre si, e que indivíduos conversem com o todo.” Esse conceito animista da Deusa não impede o culto através do Politeísmo, pois entende-se que os deuses são personalidades individuais, inseridos na Teia da Vida, e vitais para o ecossistema espiritual. A preservação do Politeísmo e de seus diversos rituais culturais diferentes é essencial para nos ensinar sobre respeito a diversidade.
Baseia-se no pensamento corporificado e na experiência pessoal: Carol P. Christ (1997) define que a Tealogia começa com a experiência pessoal, sua relação com o corpo, com os outros e a vida. Pois existe uma sabedoria profunda na corporeidade: as emoções, os insights, a mística do amor, do erótico e do prazer de viver. Uma espiritualidade que preserve e nutra a vida (planeta) só ocorrerá com a revalorização do corpo-matéria.
Acredita na mutabilidade do divino: Carol (1997) alega que as religiões patriarcais criaram uma ideia de divino transcendental, retirado da matéria e imutável. Segundo ela, nessa ideia reside grande perigo, pois tudo que é mutável foi considerado uma ameaça, como a Lua, a mulher e as estações. Os deuses na Tealogia são mutáveis, morrem e renascem com os ciclos. Dançam, trazem êxtase, alegria e confiança na matéria.
Propõe a dissolução do dualismo clássico: A Tealogia propõe uma dissolução do dualismo clássico, criado pela filosofia masculina européia, a qual prega o antagonismo entre corpo e mente, masculino e feminino, luz e sombra, bem e mal, espírito e matéria. A Tealogia acredita que não há antagonismo entre essas categorias, e que uma visão unificada e holística trará cura a todos.
Prega a possibilidade de um sistema social pacífico e libertário: Segundo Carol (1997), a Tealogia propõe, enfim, um sistema pacífico e libertário, pautado no respeito à Terra, à todos os povos, à todos os deuses, à homens e mulheres, e à todos os seres/consciências (animais, vegetais e minerais). No conhecimento animista da Teia da Vida, cada território deve ser preservado, com suas tradições, numa relação de interdependência, cooperação e amizade.
Texto de Lídia M. da C. Valle
Mestra e Doutoranda em Ciências das Religiões, pela UEPA e UFPB respectivamente.
Trata-se de um conceito cunhado na década de 70, mais especificamente em 1974, em textos do cantor e escritor neo-druida Isaac Bonewits, intitulados The Druid Chronicles – Evolved, onde ele provavelmente usou o termo "thealogian" para se referir ao autor wiccano Aidan Kelly, o qual pode ter sugerido o termo para ele ou vice versa. Apesar de diversos sites alegarem tal informação, não é nada fácil encontrar esses textos de Isaac, tendo em vista que eram revistas impressas da década de 40, que provavelmente nunca foram digitalizadas, existem apenas relatos na internet de sua existência. Entretanto, na primeira edição revisada de seu livro Real Magic (1971, 1979, 1989), de 1979, é possivel encontrar o termo facilmente, pois Isaac Bonewits definiu Tealogia em seu Glossário como "Especulação intelectual sobre a natureza da Deusa e Suas relações com o mundo em geral e os humanos em particular; explicações racionais de doutrinas religiosas, práticas e crenças [femininas], que podem ou não ter conexão com qualquer religião específica, nem como tal seja concebida e praticada pela maioria de seus membros” (BONEWITS, 1989, p. 268).
O que se observa é que Isaac se limitou a colocar o termo com uma explicação bem resumida apenas no Gloissário de seu livro, nas ultimas páinas apenas, ou seja, ele foi o precursor da terminologia, como observador de algo que estava acontecendo ao seu redor, mas parou por aí mesmo. As questões centrais da Tealogia, todavia, foram amplamente desenvolvidas por autoras posteriores, tais como Naomi Goldenberg, Rita Nakashima Brock, Charlotte Caron, Melissa Raphael e Carol P. Christ, entre outras autoras que citaram a respeito do desenvolvimento da Tealogia. O que TODAS elas tinham em comum era sua formação, a saber: a TeOlogia. Elas eram teólogas de formação, começaram a flertar com a teologia feminista, até culminarem no movimento que elas mesmas estavam criando: a TEALOGIA.
O interessante é que Naomi Goldenberg também é formada em Religious Studies (que aqui no Brasil, chamamos Ciências da(s) Religião(ões)). Sua formação acadêmica permitiu que ela fizesse uma leitura crítica e conceitual do movimento da Deusa que estava ocorrendo nos EUA, e em outros países, na época, sistematizando-as em seu livro de 1979 Changing of the Gods - feminism & the end of traditional religions. Nesta obra, ela dedica um breve tópico para explicar a Tealogia através da natureza tríplice da Deusa. Nada muito novo do que já se ouve falar sobre a Deusa desde o início de seu movimento tanto na literatura quanto na Bruxaria Moderna, porém, o terreno da Tealogia já estava "arado" a partir de então, para suas sementes serem plantadas. Sua página: https://naomigoldenberg.com/
A teóloga protestante norte-americana Rita Nakashima Brock, em seu artigo de 1989, On Mirrors, Mists and Murmurs: Toward an Asian American Thealogy, usou o termo Tealogia de forma inovadora, ao afirmar que desenvolveu uma “Tealogia do sofrimento, comunidade e cura”, a partir de várias fontes religiosas e espirituais (Budismo, Cristianismo, Paganismo, etc.), as quais são costuradas e interpretadas pelas vivências e experiências de vida das mulheres, trocadas nesses encontros.
Em 1993, a teóloga canadense Charlotte Caron da Tealogia publicou a obra To Make and Make Again: Feminist Ritual Thealogy. Em sua obra, ela desenvolve uma grande discussão sobre o tema, enuncia os métodos e características da Tealogia, além de sugerir diversas formas rituais, motivadoras de novas atitudes sociais, para as mulheres vivenciarem essa espiritualidade.
Em 1996, a teóloga judia inglesa Melissa Raphael publicou Thealogy and Embodiment: the post-patriarchal reconstruction of female sacrality. Melissa discute sobre a relação da Tealogia com a corporeidade humana, em especial os trabalhos/atributos considerados "femininos" (e tece suas críticas), o tabu da menstruação e as cosmogonias advindas do útero.
A autora também escreveu Introducing Thealogy: Discourse On The Goddess em 1999. Neste livro, Melissa traz a história política da Tealogia, sua relação com o movimento feminista e a Teologia feminista, bem como o distanciamento posterior da Tealogia desses movimentos. Discute também a ética na Tealogia, o Ecofeminismo, o bem e o mal na Tealogia e o lugar do homem na Tealogia.
Carol P. Christ também era teóloga judia e já havia usado o termo em sua obra Laughter of Aphrodite: reflections on a journey to the goddess em 1987. Carol P. Christ lançou vários outros livros sobre o tema, ao longo de sua vida, e tornou-se uma das principais autoras da Tealogia, entre eles estão: Rebirth of the goddess (1997), She Who Changes (2003), A Serpentine Path: Mysteries of the Goddess (2016) e Goddess and God in the World: Conversations in Embodied Theology (2016).
No livro Rebirth of the goddess (1997), traduzido recentemente para o português como o Renascimento da Deusa, em 2024, pela editora Goya (Aleph), Carol discute a Tealogia de forma profunda. Ela traz também os significados da Deusa, as evidências do passado, a resistência acadêmica em avançar nos seus estudos, bem como traz discussões éticas da Tealogia, a Teia da vida, a Mãe-Terra como organismo vivo e consciente (hipótese Gaia), cooperação e preservação ambiental, o lugar da humanidade nessa teia, vida após a morte, e a importância da preservação das imagens politeístas da Deusa para fomentar o respeito a diversidade dos grupos humanos.
Percebe-se que o termo Tealogia começou a ser “forjado” a partir das vivências das mulheres em grupos comunitários de apoio mútuo e, também, de reflexões dentro da própria academia. As autoras, na sua totalidade acadêmicas, começaram a buscar nas fontes arqueológicas, antropológicas, mitológicas e simbólicas algo que melhor representasse aquilo que as mulheres viviam e narravam em suas reuniões femininas guiadas pelo conceito divino de Deusa. A crença na Deusa já existia em outros grupos neopagãos, na Bruxaria Moderna, etc., entretanto foi expandida e delineada na Tealogia. Nota-se, então, que a Tealogia trata-se de um movimento filosófico, nascido da experiência, mas também de mulheres ligadas a instituições de ensino de Teologia e Ciências da Religião. Dessa forma, tem as características de buscar responder/refletir acerca dos mistérios da vida, a ética, nossa relação com o mundo e as formas de nutrir um novo estilo vida.
Baseado no primeiro livro de Tealogia traduzido para o português, o Renascimento da Deusa, de Carol P. Christ (o original foi publicado em 1997), sintetizei os principais princípios da Religião da Deusa desenvolvidos por Carol. Uma das características básicas de sua obra é se basear no Imaginário da Deusa pré-histórica, defendida por alguns arqueólogos e estudiosos, como James Mellaart, Marija Gimbutas, Riane Eisler, etc., a qual foi batizada por Gimbutas como Deusa da Vida, Morte e Renascimento. As sociedades pré-históricas, em especial as neolíticas, tinham uma formatação menos bélica, mais agricultora, comunitárias e centradas nos ciclos soli-lunares. Desse modo, a Tealogia de Carol Christ está mais ligada a esse momento do feminino divino do que necessariamente nas deusas do politeísmo tardio, onde os deuses celestres patriarcais já estavam no topo da hierarquia. Segue, então, os princípios básicos da Tealogia em Renascimento da Deusa:
Culto à Mãe - Terra e à outras faces da Deusa: Carol P. Christ (1997) afirma que no pensamento da Tealogia, devido ao foco no divino feminino, no culto à Mãe-Terra e na materialidade, trata-se de uma espiritualidade prática, voltada também a vida imanente e material, à nutrição da vida na Terra, preservação ecológica e, também, à ampliação da visão dos papéis femininos na sociedade, haja vista a diversidade de deusas e arquétipos femininos possíveis mesmo na lógica unificadora de Deusa.
Culto à Teia da Vida e a interdependência de todos: Dessa forma, volta-se a entender toda a TEIA da VIDA como sagrada (a própria Deusa). Todas as plantas, animais e elementos da natureza passam a fazer parte do corpo espiritual tealógico, e todos esses seres estão conectados em interdependência na teia. A experiência mística ocorrerá, então, na vivência da comunidade, na preservação do planeta e em relações saudáveis.
É um sistema Panenteísta e Politeísta: Carol (1997) define que “a mente da Deusa é uma energia animadora que permeia o corpo do mundo e que permite que tudo [...] converse entre si, e que indivíduos conversem com o todo.” Esse conceito animista da Deusa não impede o culto através do Politeísmo, pois entende-se que os deuses são personalidades individuais, inseridos na Teia da Vida, e vitais para o ecossistema espiritual. A preservação do Politeísmo e de seus diversos rituais culturais diferentes é essencial para nos ensinar sobre respeito a diversidade.
Baseia-se no pensamento corporificado e na experiência pessoal: Carol P. Christ (1997) define que a Tealogia começa com a experiência pessoal, sua relação com o corpo, com os outros e a vida. Pois existe uma sabedoria profunda na corporeidade: as emoções, os insights, a mística do amor, do erótico e do prazer de viver. Uma espiritualidade que preserve e nutra a vida (planeta) só ocorrerá com a revalorização do corpo-matéria.
Acredita na mutabilidade do divino: Carol (1997) alega que as religiões patriarcais criaram uma ideia de divino transcendental, retirado da matéria e imutável. Segundo ela, nessa ideia reside grande perigo, pois tudo que é mutável foi considerado uma ameaça, como a Lua, a mulher e as estações. Os deuses na Tealogia são mutáveis, morrem e renascem com os ciclos. Dançam, trazem êxtase, alegria e confiança na matéria.
Propõe a dissolução do dualismo clássico: A Tealogia propõe uma dissolução do dualismo clássico, criado pela filosofia masculina européia, a qual prega o antagonismo entre corpo e mente, masculino e feminino, luz e sombra, bem e mal, espírito e matéria. A Tealogia acredita que não há antagonismo entre essas categorias, e que uma visão unificada e holística trará cura a todos.
Prega a possibilidade de um sistema social pacífico e libertário: Segundo Carol (1997), a Tealogia propõe, enfim, um sistema pacífico e libertário, pautado no respeito à Terra, à todos os povos, à todos os deuses, à homens e mulheres, e à todos os seres/consciências (animais, vegetais e minerais). No conhecimento animista da Teia da Vida, cada território deve ser preservado, com suas tradições, numa relação de interdependência, cooperação e amizade.
Texto de Lídia M. da C. Valle
Mestra e Doutoranda em Ciências das Religiões, pela UEPA e UFPB respectivamente.
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